2020: O ano em que tudo acontece, mas onde nem tudo é falado

É em 1505, aquando da chegada de Vasco da Gama que nasce a ligação de Portugal a Moçambique, um território dotado de ricos e extensos recursos naturais. Durante mais de quatrocentos anos Moçambique foi uma das colónias portuguesas, tendo atingido a sua independência em 1975. Desde então faz parte da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e tem em Portugal um dos mais importantes parceiros económicos.

Falemos então de Cabo Delgado. Cabo Delgado é uma província a norte de Moçambique, que tem sido alvo de ataques terroristas faz já três anos, provocando cerca de 2000 mortes e forçando cerca de 355 mil pessoas deslocarem-se para sul do país.

Todos sabemos que o ano de 2020 tem sido um ano atípico. Atravessamos uma pandemia que dominou tudo e todos, que nos fez mudar hábitos, rotinas e cancelar eventos e tradições. Esta nova fase trouxe ao de cima o melhor e o pior de todos nós, no entanto também nos fez parar para refletir sobre o que nos rodeia, chamando à atenção para determinados problemas estruturais da nossa sociedade. Assim vimos crescer movimentos e ondas de solidariedade nacionais e internacionais com vista sensibilizar para certas causas, a título de exemplo veja-se o movimento intitulado de Black Lives Matter – um movimento contra a violência policial a negros que nasceu nos Estados Unidos da América e ganhou força por todo o mundo tornando-se mesmo num movimento ativista internacional e colocando o tema do racismo em cima da mesa de discussão em diversos países, inclusive Portugal.

Pese embora este contexto, o que se fala acerca dos ataques terroristas em Moçambique que referenciei acima? Infelizmente, não se viram surgir ondas de solidariedade para com este país, nem movimentos nas redes sociais que ganhassem força e alertassem todos os cantos do mundo sobre o que se está a passar. A (des)mobilização da esfera pública e da sociedade civil é desoladora e revoltante. Até quando é que se irá durar este silêncio?

Onde estão os defensores dos direitos humanos, que se fizeram ouvir aquando de acontecimentos de violência policial contra negros?

O nosso ministro dos negócios estrangeiros referiu, e passo a citar, que “não podemos deixar que a África oriental se torne um território de influência de redes terroristas”. Posto isto, onde estão as ações reais para que isso aconteça? Onde está o alerta do Governo português às instituições europeias para uma resposta conjunta?

Por todas as nossas ligações a este povo, Moçambique também merece a nossa solidariedade! Estes massacres sucessivos merecem, urgentemente, um grito de força e sobretudo atuação política.

Se todas as vidas importam, e a pandemia é a prova disso, porque é que ninguém se importa com Moçambique?