E um Sistema de Saúde Europeu?

A prestação de cuidados de saúde e a gestão das instituições prestadoras destes cuidados são um desafio de natureza complexa para qualquer estado. Por um lado, porque padecem de uma incessante busca por um modelo de financiamento que reflita rigorosamente a despesa e os recursos gastos com os doentes, por outro lado, porque habitam num mercado imprevisível do lado da procura e ainda porque estão dependentes de uma crescente inovação tecnológica e científica na busca da melhor evidência.

 

A Declaração Universal dos Direitos Humanos prevê no artigo 25º o direito à saúde e ao bem-estar e à assistência médica, mas existe uma clara evidência de que este direito fundamental não se cumpre, quer em vários países no mundo, quer em determinados casos na Europa.

A crise económica e a necessidade constante de revisão dos orçamentos de estado implicam, em alguns dos casos, uma diminuição do investimento na despesa em Saúde, o que no imediato conduz a um problema de acesso aos cuidados pelas pessoas.

 

Na Europa temos sobretudo quatro fontes principais de financiamento dos cuidados de saúde: os impostos, os subsistemas sociais de seguro, seguros privados ou pagamentos diretos. Em alguns países estas tipologias podem ser combinadas e os modelos de financiamento podem ser  mistos entre estas quatro fontes.

Estas formas de financiamentos dos serviços de saúde são na grande maioria motivadoras de iniquidade no acesso ou porque, nos estados com saúde totalmente gratuita, se assiste a uma diminuição do investimento em ciclos económicos menos favoráveis ou porque são as pessoas que não tem capacidade para co-financiarem ou pagarem totalmente esta actividade.

Segundo as diretrizes da União Europeia, os sistemas de saúde têm de ser acessíveis, eficazes e resilientes face às mudanças e aos constantes desafios, mas inevitavelmente existem factores que condicionam a natural evolução da despesa e que podem ser determinantes para regular as políticas de saúde e conduzir as decisões que melhor favoreçam os cidadãos.

Por um lado é inevitável olhar para as alterações demográficas que resultam do envelhecimento da população e para o aumento da carga de doença, devido às morbilidades condicionadas pelo incremento das doenças crónicas, que obrigará a um redimensionamento da prestação de cuidados e a uma aposta em estruturas de cuidados que proporcionem melhor qualidade de vida.

Por outro, não podemos esquecer que a falta de recursos, bem como distribuição desigual dos profissionais, o grau de capacitação dos doentes e a introdução de novas tecnologias também condicionam a prestação dos cuidados de saúde.

 

É nesse sentido que admito que a Europa poderá ter um papel importante quer regulador  quer no desenvolvimento de um Sistema de Saúde Europeu que permita ter um acesso universal e livre a todos os cidadãos e que garanta sobretudo equidade no acesso aos cuidados, tendo ainda como objetivo proporcionar aos cidadãos a melhor evidencia terapêutica rendida aos melhores avanços tecnológicos de uma forma uniforme em todo o continente europeu.

Um sistema de saúde único com um financiamento proveniente da União Europeia ajustado às necessidades de cada país, poderá ser um formato interessante de distribuir os recursos, mas ao mesmo tempo de reorganizar os sistemas e as organizações, delegando à tutela de cada país membro a missão de regular e avaliar a contratualização dos outcomes e dos resultados pretendidos com as respectivas instituições de saúde.

Desta forma, um Sistema de Saúde Europeu, uniforme e com livre acesso, com um financiamento que tenha em conta a integração e a produção de cuidados, que reflita os ganhos em saúde definidos por uma política europeia comum e que traduza os padrões de qualidade e eficácia pretendidos, poderá ser um passo decisivo para termos uma Europa com saúde sem diferenças no acesso e com garantias de segurança e qualidade aos doentes e aos seus cidadãos.

 

Artigo de Opinião realizado no âmbito do concurso “Uma Ideia para a Europa“.