O Papel da Europa, O Papel de Portugal

Nas últimas seis décadas, a União Europeia tem sido o principal garante da paz e prosperidade no espaço europeu. Um continente que viu originar as duas maiores guerras da humanidade, e onde a disputa constante entre os estados foi a norma durante milénios, hoje existe como um local democrático, livre, e sem fronteiras. Mesmo tendo em conta os defeitos (e não são poucos) desta união, seria de esperar que os feitos da UE fossem celebrados por todos os europeus, e que a União Europeia fosse vista com respeito e admiração pelos cidadãos europeus.

A verdade é que, em Portugal e no resto da Europa, a União Europeia é encarada com pouco mais que indiferença, algo que se vê facilmente quando consultamos os dados sobre participação eleitoral. No nosso país, nas últimas eleições para o parlamento europeu, apenas um terço dos eleitores exerceu o seu direito de voto. É uma situação infeliz, especialmente tendo em conta que foi em grande parte graças à UE que Portugal conseguiu elevar os seus padrões de vida até aos níveis de hoje. É talvez esta apatia, mais que qualquer outro sentimento perante a UE, que melhor explica os vários movimentos eurocéticos que temos observado a crescer nos últimos anos.

Como as próximas eleições para o parlamento europeu não estão tão distantes quanto isso, começa a ser necessário pensar que género de mensagens devem chegar aos eleitores nesta campanha, não só em termos de programa partidário, como no que toca ao apelo ao voto. E se os portugueses não se interessam pelo principal órgão da União Europeia, é preciso perguntar que mais podemos dizer para os convencer da importância de se verem representados através do seu voto.

Para que serve, de facto, a União Europeia? Se questionarmos um qualquer cidadão acerca deste assunto, é provável que mencionem o financiamento europeu de inúmeros projetos de desenvolvimento regional por este país fora ou que, por outro lado, refiram as sempre presentes regulações e normas europeias (algumas, como as quotas de pesca, altamente contestadas e por vezes impopulares), que hoje constituem uma componente importante da nossa lei e política económica. Se apenas pensarmos nestas suas funções, torna-se um pouco mais fácil compreender o desinteresse que muitos mostram perante a União Europeia e os seus processos eleitorais. Porquê inquietarmo-nos com uma organização cujas políticas parecem tão distantes do indivíduo?

Mas esta visão da União Europeia, que ora serve de banco para quando é preciso, ora serve de arquiteto de minúcias burocráticas, é extremamente redutora, e ignora aqueles papeis que a Europa terá de ter num futuro que se afigura cada vez mais complexo e incerto.

É preciso reconhecer que, num mundo cada vez globalizado, torna-se impossível os estados atuarem isoladamente nas relações internacionais. Embora tenhamos outros laços privilegiados, como com os países da CPLP, Portugal, sozinho, tem uma influência no palco mundial relativamente limitada. É através da União Europeia que Portugal se vê representado naquelas decisões que mais vão marcar o nosso futuro: questões de direitos humanos e democracia, legislação sobre tecnologia, e políticas contra a desigualdade e a pobreza mundial. Estes, sim, são temas que interessam aos portugueses e que devemos poder debater.

Espero que, nestas próximas eleições, os nossos representantes políticos saibam reconhecer que o papel da Europa vai para além da economia e das finanças, que sensibilizem os eleitores para a importância de termos uma voz forte no parlamento europeu, e que tragam para o espaço de debate novos temas que apenas podem ser tratados de uma forma efetiva dentro dos órgãos democráticos da União Europeia, sem recorrer apenas aos mesmos pontos que já se discutem nas eleições legislativas nacionais. Se queremos que aquilo que Portugal tem para dizer ao Mundo seja ouvido, temos de nos assegurar que o resto da Europa nos ouça primeiro.