Profissionalização do ensino: do estigma à ação

Diz o provérbio popular: “Em terra de cegos, quem tem olho é Rei”. Em terra de doutores, engenheiros e demais portadores de títulos honoríficos, o Zé Povinho já não tem lugar. As escolas técnicas foram extintas e o ensino já não serve as necessidades básicas. Como dispensamos um farmacêutico a instalar o sistema elétrico de nossa casa, urge capacitar outros para o fazer. Surpreendentemente, esta é já uma espécie em vias de extinção: o indivíduo sem carta de curso.

Findo o ensino básico, os jovens portugueses dualizam-se entre ensino profissional e ensino tradicional. Sendo o primeiro amplamente estigmatizado e diminuído, milhares de jovens optam por uma área de estudos e iniciam ensino secundário. Volvidos três anos de estudo, os jovens são novamente chamados a decidir o seu futuro. Consoante o financiamento e aptidão escolherão ingressar no mercado laboral ou prosseguir para o ensino superior.

Em cenário favorável, a primeira opção pagará salários baixos facilmente justificados pela falta de experiência dos candidatos. Numa perspetiva dantesca e realista, a alvorada do desemprego. Com uma taxa de desemprego jovem na ordem dos 18%, o Portugal é confrontado com um flagelo que não consegue debelar. Sendo o Estado responsável por oferecer alternativas para fixar o capital humano que tanto custou a formar, poucas são as hipóteses verdadeiramente cativantes.

Por outro lado, o ensino superior. Num cenário utópico onde os jovens conseguem rendas sustentáveis nos grandes centros, esta apresenta-se como a melhor alternativa para cimentar as bases do ensino secundário. Sem surpresa, milhares de euros depois, grande parte dos jovens compra bilhete de 1ª classe para o centro de emprego. Inconformados com o país padrasto, muitos vão além fronteiras em busca do sonho, da emancipação que em território nacional tarda em chegar. E são reconhecidos lá fora. Valha-nos isso: pelo menos, formamos bem.

Na população jovem, a opinião é unânime: as opções apresentadas no ensino secundário são escassas e pecam pela generalidade excessiva. Como tal, para efeitos de conclusão do ensino obrigatório, muitos jovens são forçados a escolher áreas que não espelham os seus verdadeiros interesses. Assim, jovens desanimados e descontentes com a escolha tomada, prosseguem um percurso que não se afigura animador.

Nos países desenvolvidos desta vida, escolas profissionais estão em pé de igualdade com as ditas escolas tradicionais. Nestes, o investimento capacitante no ensino profissional é uma realidade. Veja-se o caso da Alemanha que sustenta grande parte da sua capacidade produtiva em cargos técnicos e profissionais. Em Portugal, tal realidade é ainda uma visão idílica e demasiado precoce. País de brandos costumes, a educação tarda em sofrer reestruturações que a capacitem para os desafios futuros.

Não obstante, foi recentemente concebida uma nova via de acesso ao ensino superior —em alternativa aos exames nacionais- exames regionais. Poder-se-á louvar tal medida pois permitirá a alguns estudantes reverterem a decisão tomada anos antes e ingressar no ensino superior.

No entanto, o problema de fundo mantém-se inalterado e os jovens que não pretendam seguir o dito ensino superior são fortemente desconsiderados.

Vivemos tempos de grande incerteza, não só economica e laboral mas também educativa. Aproveite-se, então, para reformar o paradigma do curso superior como fim último para a concretização pessoal. Importa combater a mentalidade de país pequeno e renovar os estabelecimentos de ensino profissional que estão desadequados.

Ao investir fortemente na capacitação do ensino profissional seja pela revitalização dos Cursos Técnicos Superiores Profissionais ou pela aproximação com empresas locais, novos postos de trabalho serão criados e o talento será fixado. Assim, teremos os mais capazes no auge da sua capacitação. Como um dia uma figura incontornável disse: existem os Estados sociais, os Estados corporativos e o Estado a que isto chegou. Os jovens de hoje não se conformam, não esperam mais. Chegou a hora de mudar, de revitalizar o ensino profissional em Portugal.