Turismo | Capitalizar e o choque ao consumo

É hoje consensual que o nosso destino turístico, continua a ser o que era e que esta pandemia do COVID-19 não alterou ou destruiu os nossos principais activos (que são: os produtos turísticos, infra-estruturas públicas e privadas, destinos, a qualidade dos recursos humanos, a luz, o clima, a segurança, etc.), mas sim e por momentos, alteraram-se dois factores chave no turismo que são recuperáveis de forma rápida, tais como: a livre circulação de pessoas em território europeu, e além fronteiras, e a confiança dos turistas em viajar. Nestes campos, partimos da mesma linha que os nossos concorrentes e temos (até ver) uma melhor história para contar que muitos deles na contenção da pandemia, como já tem feito e bem, o Turismo de Portugal, I.P. junto dos principais mercados emissores. E até antecipamos algumas medidas como o selo “Clean & Safe” (por exemplo, em relação ao colosso turístico que é Espanha). Estamos a ganhar a primeira batalha, mas temos ainda muitas mais…

As batalhas seguintes a meu ver serão: i) a capitalização das empresas turísticas e um ii) conjunto de medidas de promoção efectiva do consumo de “bens”  turísticos por parte do mercado interno (que será o nosso target para este verão), para além eventualmente do mercado Espanhol e da emigração. Todas estas propostas terão que ser obviamente analisadas em conjunto com outras, para que seja medido o seu impacto financeiro nas contas do país (mas as alternativas, serão ainda menos receita fiscal e mais desemprego e com isto, mais despesa na Segurança Social).

  1. Capitalização das empresas turísticas é mesmo necessária (como refere o PSD):

Considerando que até não há muitos anos – dados de 2014 do Banco de Portugal – referiam que as empresas do sector turístico registavam problemas estruturais e financeiros, e que mais de metade das empresas com dívida financeira (concretamente 55%), não conseguiram gerar E.B.I.T.D.A. (Lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) suficiente para o pagamento dos juros (sector de capital intensivo e empresas turísticas/hoteleiras estão fortemente endividadas). “Este indicador foi particularmente elevado no caso das microempresas (59%) e no segmento do “Alojamento e restauração” (62%).[1]

Considerando também que entretanto tivemos anos turísticos excelentes e que estas empresas foram por essa via, e pela baixa considerável das taxas de juro, conseguindo pagar os juros e ainda o serviço da dívida (e talvez acumular algum capital), e que mesmo assim as dívidas não terão desaparecido de todo, urge encontrar soluções que não onerem ainda mais o tecido empresarial que viu nas últimas semanas as suas receitas a desaparecerem.

Nesse sentido, parece-me crucial encontrar mecanismos que permitam às empresas hoje não incumprirem os rácios de cobertura dos financiamentos (bancários ou comunitários) em virtude da perda de receita, mas sobretudo pela via do incremento da dívida (linhas de apoio COVID-19). Mais a mais, para que no futuro consigam obter financiamento (comunitário) para crescerem e executarem programas de inovação e digitalização que serão fundamentais para o ganho de competitividade nos tempos do pós-pandemia.

Assim, os financiamentos do Estado português às empresas no âmbito do COVID-19, devem muitos deles ser convertidos em capital (e esse capital investido pelo Estado, deve ser acompanhado pela Portugal Ventures ou então, voltarmos a ter uma capital de risco para cada setor chave da economia nacional – o que a meu ver não seria uma opção desejável). Seria ainda importante, incentivar a entrada de capital próprio (privado) nas empresas portuguesas, pois existe muita liquidez no mercado europeu e extracomunitário disponível para investir em boas empresas e negócios, criando para esse efeito benefícios fiscais em sede de IRC.[2]

2. Estímulo ao consumo pelo mercado interno:

Todas as estimativas indicam que o turismo doméstico irá recuperar mais cedo que o internacional, dada a relutância dos viajantes em viagens de longa distância e as restrições que ainda podem ser mantidas nas viagens entre países. Os destinos do território continental serão de maior facilidade de acesso, pois poderão ser acedidos em veículo próprio sendo que os nossos arquipélagos poderão ter o handicap da falta de confiança dos turistas nacionais em frequentar aeroportos e aviões, para além do custo acrescido que estas viagens sempre acarretam.

Urge assim, definir políticas que incentivem o consumo. Ficam três ideias que já têm sido lançadas para debate, tendo sida a sua discussão ainda muito limitada:

  • Dedução em sede de IRS de 100% do IVA suportado no consumo em alojamentos turísticos e restauração entre os meses de Julho e Setembro, existindo um limite máximo por cada contribuinte. Esta medida teria que ser acompanhada de uma comunicação explicativa muito forte e ter um slogan dentro do qual as pessoas percebam que “ajudam hoje, recebendo amanhã”. Permitiria ainda aliviar o OE deste ano, atirando esta despesa para o próximo ano.
  • A comparticipação das viagens pelo Estado aos portugueses não residentes nas Regiões Autónomas (na mesma medida do que acontece para os residentes). Para além da ajuda às companhias aéreas, e com isto incrementar a atractividade dos destinos para as mesmas, seria uma forma de potenciar estas Regiões e permitir que os portugueses visitem as suas Ilhas a valores mais atrativos (proposta já efectuada pelo Presidente do Governo Regional da Madeira ao Governo nacional durante o mês de abril).
  • Uma terceira e última medida que me parece fundamental para potenciar o mercado interno em termos turísticos: a redução ou eliminação das portagens e scuts entre os meses de julho e setembro, por forma a estimular a ida dos portugueses às várias regiões e destinos do território continental.

Haverão muitas mais medidas, mas estas parecem-me no imediato muito importantes para tentar mitigar os problemas que as empresas do setor do turismo estão e irão enfrentar durantes os próximos meses, e de aplicabilidade equitativa pelo país.

Mais uma vez, e como sempre, todos teremos que ser Primeiro Portugal.

 

[1] Fonte: Análise do setor do turismo – Estudos da Central de Balanços – Banco de Portugal – Out 2014

[2] PROJETO DE RESOLUÇÃO N.o 221/XIII/1.a do Grupo Parlamentar do PSD de 2016: https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=40182