Portugal, Evasão Fiscal e Paraísos Fiscais

Em percentagem do PIB, Portugal é dos países da União Europeia que mais milhões de euros perde com a transferência de riqueza para offshores.

Segundo um estudo da Comissão Europeia, as medidas tomadas nos últimos anos têm resultado numa diminuição da evasão fiscal. No entanto, esta realidade continua a ser um problema de grande dimensão. Os dados mais recentes deste estudo dizem respeito a 2016. Nesse ano, em Portugal, a riqueza transferida para paraísos fiscais correspondia a 23,9% do PIB. Para um país com a dimensão do nosso, a proporção desta transferência de riqueza, com o intuito de usufruir de tributações mais reduzidas ou de isenções, é de significante preocupação, nomeadamente no que diz respeito à captação de receita fiscal.

Menor receita fiscal significa menos recursos disponíveis, traduzindo-se num empobrecimento dos serviços públicos. Em 2010, um estudo de Richard Murphy – especialista britânico na área da fiscalidade – concluiu que relacionando as perdas fiscais com os gastos totais do Estado, as perdas associadas à evasão fiscal, em Portugal, permitiriam pagar 63,1% dos custos relacionados com a Saúde.

Um maior combate à evasão fiscal, permitiria aumentar a receita fiscal e, por conseguinte, aumentar os recursos disponíveis do Estado. Este aumento possibilitaria uma maior flexibilidade e capacidade decisiva em questões políticas com impacto social e económico. Por exemplo, facilitaria uma descida dos impostos. Estas descidas podem estar diretamente associadas aos consumidores, como é o caso a descida do IVA sobre a eletricidade doméstica, assunto da atual agenda política, ou refletirem-se numa redução do IRC que poderia ser favorável à atração de investimento direto estrangeiro para o nosso país.

Em maio deste ano, o eurodeputado do PSD, Paulo Rangel, destacou a dimensão do problema à escala europeia, ao referir que a evasão fiscal e a corrupção correspondem a uma perda de um bilião de euros em receitas, na União Europeia, e que por isso o combate a estas práticas deve ser uma prioridade.  Torna-se, pois, essencial assegurar uma ação nacional e internacional de combate às transferências para os paraísos fiscais, de modo a reduzi-las. Neste contexto, destaco a recente investigação do Diário de Notícias no âmbito do projeto Investigate Europe. Esta reportagem veio revelar que o atual Governo Português é um dos Estados-Membros que tem bloqueado uma diretiva de combate à evasão fiscal de grandes multinacionais (CBCR), no Conselho da União Europeia. Já aprovada pela Comissão Europeia em 2016 e pelo Parlamento Europeu em 2017, esta diretiva encontra-se parada, desde então, no Conselho da EU. Portugal bloqueia a aprovação desta diretiva, pelo facto de, até ao momento, não ter tomado posição.

Esta situação reflete uma contradição entre aquilo que o partido socialista defende no seu programa eleitoral – uma maior cooperação europeia nesta matéria – e as posições dos eurodeputados socialistas, que parecem não reconhecer a vantagem de existir uma maior partilha comunitária de informações fiscais relacionadas com gigantes empresariais.

Depois de inúmeras críticas nacionais e internacionais, o DN publica uma nova notícia, a 27 de novembro, informando que após as perguntas do DN, o Governo veio agora anunciar que Portugal votará a favor da diretiva. Com menor ou maior grau de causalidade entre a reportagem e a mudança de decisão, este caso é um alerta para a importância do papel dos meios de comunicação social enquanto fiscalizadores daqueles que nos representam na UE.

Em suma, com menores níveis de evasão fiscal, Portugal ficaria a ganhar a vários níveis, já que uma maior receita fiscal, permitiria uma gestão mais eficiente dos recursos e promoveria uma maior confiança política. Em matéria de combate à evasão fiscal ainda há muito a ser feito e a aprovação de diretivas neste sentido não deve ser bloqueada.