CNE dá razão à JSD quanto à polémica do cartaz à porta do Avante

Comissao Nacional de Eleições (CNE) dá razão à JSD sobre remoção ilegal do cartaz na Festa do Avante. Fica a conhecer a posição oficial da CNE:

“Exmos. Senhores Juventude Social Democrata,

Reportando-me ao assunto em referência e por delegação do Secretário da Comissão, comunico a V. Exas. que, na reunião plenária de 20 de outubro p.p., desta Comissão, foi tomada a seguinte deliberação:

«1. Vem a Juventude Social Democrata reportar a esta Comissão, em síntese, que no dia 4 de setembro de 2020, afixou um cartaz de propaganda política, tendo constatado que no mesmo dia o cartaz havia sido removido, solicitando a restituição do cartaz e a sua afixação no local.

2. Notificada para se pronunciar, a entidade visada alega, em síntese, que a afixação viola as normas regulamentares e põe em risco as condições de segurança do evento. Na documentação remetida pala Câmara Municipal do Seixal consta a notificação remetida ao participante para a remoção da estrutura de propaganda, invocando que aquela desrespeita o previsto no artigo 11.º do Regulamento Municipal de Afixação, Inscrição, Instalação e Difusão de Publicidade e Propaganda (RMAIIDPP) e que, para além disso se encontra «(…) no espaço destinado a corredor de emergência, definido no Plano Prévio de Intervenção de Proteção Civil para a Festa do Avante e Plano Municipal de Emergência e Proteção Civil.» (PPI), bem como por não observar o estipulado no n.º 1 do artigo 47.º do RMAIIDPP.

3. Importa começar por realçar que em sede de propaganda vigora o princípio da liberdade de ação e propaganda das candidaturas (cfr. alínea a), do n.º 3, do artigo 113.º da CRP), como corolário do direito fundamental de «exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio» (n.º 1 do artigo 37.º da CRP).

Deste regime constitucional resulta, designadamente, que a afixação de mensagens de propaganda em lugares ou espaços públicos, seja qual for o meio utilizado, é livre e apenas pode ser limitada por via de lei.

4. Em termos de legislação ordinária, invoca-se a Lei n.º 97/88, de 17 de agosto, que regula a matéria de afixação ou inscrição de mensagens de propaganda, resultando do mencionado diploma que a atividade de propaganda é livre, não carecendo de comunicação, autorização ou licença prévia por parte das autoridades administrativas. Apenas está sujeita a licenciamento, nos termos gerais, quando envolva a execução de obras de construção civil e pode ser desenvolvida a todo o tempo, não estando limitada aos períodos eleitorais. De outro modo, estar-se-ia a sujeitar o exercício de um direito fundamental a um ato prévio e casuístico de licenciamento, o que poderia implicar o risco de a efetivação prática desse direito cair na disponibilidade dos órgãos da Administração.

5. As proibições à liberdade de propaganda estão expressa e taxativamente previstas no n.º 2 do artigo 4.º do referido diploma as quais devem ser interpretadas de forma estrita e não restritiva para os direitos, liberdades e garantias.

6. Afigura-se, no caso em apreço, que nenhum dos argumentos aduzidos pela autarquia pode considerar-se procedente à luz das normas que regulam a atividade de propaganda, porquanto o local onde a mesma foi realizada não está vedado pela lei, nem o exercício da atividade de propaganda pode ser cerceado por um regulamento administrativo ou por um ato de uma autoridade administrativa.

Ademais, ainda que a estrutura de propaganda contendesse com o «(…) espaço definido para a circulação de veículos de emergência, no corredor de emergência» ou reduzisse a «(…) largura das vias de acesso definidas no mencionado PPI para acesso ao recinto do evento (…)» estando propaganda legalmente afixada, dispõe o artigo 6.º da Lei n.º 97/88, de 17 de agosto, que a sua remoção é da responsabilidade das entidades que a tiverem instalado, competindo às câmaras municipais, ouvidos os interessados, definir os prazos e condições de remoção dos meios de propaganda utilizados.

De acordo com o entendimento da Comissão Nacional de Eleições a este respeito, as entidades apenas podem remover meios amovíveis de propaganda que conflituem com o disposto no n.º 1 do artigo 4.º da Lei nº 97/88, de 17 de agosto, quando tal for determinado por tribunal competente ou os interessados, depois de ouvidos e com eles fixados os prazos e condições de remoção, o não façam naqueles prazos e condições, sem prejuízo do direito de recurso que a estes assista.

Excecionalmente podem ser removidos meios amovíveis de propaganda que afetem direta e comprovadamente a segurança das pessoas ou das coisas, constituindo perigo iminente, situação incompatível com a observância das formalidades legais, sem prejuízo de os interessados serem imediatamente notificados.

7. Acresce que o facto de ser alegado que «[a] rapidez da instalação e a falta de informação sobre a montagem, não apresenta garantias de estabilidade, existindo o receio de queda sobre pessoas e veículos» não é por si só suficiente para fundamentar a remoção da propaganda, não devendo o seu exercício ser condicionado pela celeridade da sua afixação ou por a autarquia não ter sido previamente informada da sua montagem.

8. Na realidade, quanto ao invocado RMAIIDPPI, importa referir que não cabe aos órgãos municipais definir, por via regulamentar, os critérios de localização e afixação de propaganda política e eleitoral, matéria que já se encontra tratada em lei, em conformidade com o quadro constitucional vigente, e à qual as entidades públicas estão sujeitas; nem a Lei n.º 97/88, de 17 de agosto, concede qualquer margem de decisão à Assembleia ou Câmara Municipal para determinar, por regulamento, locais proibidos para a afixação de propaganda, para além dos que estejam previstos no artigo 4.º, n.º 3, do referido diploma.

Do artigo 18.º da CRP e da jurisprudência constitucional (maxime Acórdãos n.os 248/86 e 307/88) resulta, em síntese, que tudo o que seja matéria legislativa atinente ao direito de liberdade de expressão, nomeadamente sobre propaganda, e não apenas as restrições do direito em causa, terá que ser regulado por Lei da Assembleia da República ou Decreto-Lei parlamentarmente autorizado (cfr. artigo 165.º n.º 1 alínea b) da CRP).

Nesta conformidade, os órgãos autárquicos não têm competência para regulamentar o exercício da liberdade de propaganda, cabendo-lhes apenas, ao abrigo do artigo 11.º da Lei n.º 97/88, a emissão de normas de mera execução da lei, pelo que os artigos 11.º e 47.º do RMAIIDPPI contrariam frontalmente o enquadramento legal e a jurisprudência constitucional sobre a matéria, ao fazerem depender a afixação, inscrição e instalação de propaganda política de prévio licenciamento e de comunicação ao Presidente da Câmara Municipal, pois caso estivesse sujeita a comunicação prévia ou à obtenção de licença (como se de atividade de publicidade se tratasse), a atividade de propaganda deixaria de ser livre.

9. Quanto à instauração de processos de contraordenação neste âmbito, importa sublinhar que o Tribunal Constitucional decidiu, no Acórdão n.º 631/95, declarar inconstitucional o n.º 4 do artigo 10.º, da Lei n.º 97/88, de 17 de agosto, “(…) na parte em que atribui ao presidente da câmara da área onde a contra-ordenação for praticada a competência para aplicar a correspondente coima e em que se subtrai, implicitamente, aos princípios gerais de direito criminal a apreciação da responsabilidade do agente, por violar o disposto no n.º 3 do artigo 37.º da Constituição;”.

Do acórdão ora citado, conjugado com o n.º 3 do artigo 37.º da CRP, resulta que a apreciação das infrações cometidas no exercício dos direitos de liberdade de expressão e informação, onde se integra a liberdade de propaganda, está reservada, em exclusivo, aos tribunais judiciais ou às entidades administrativas independentes. Desse modo, é entendimento da Comissão não ser admissível a previsão do artigo 53.º do RMAIIDPPI por colidir com a imposição constitucional prevista no n.º 3 do art.º 37.º da Lei Fundamental.

10. Face ao que antecede, atendendo à fundamentação supra expendida, os citados artigos do RMAIIDPPI não se coadunam com o enquadramento jurídico-constitucional da propaganda, não se afigurando existir fundamento suficiente para a remoção da estrutura de propaganda em causa, nem o exercício da atividade de propaganda pode estar sujeito à discricionariedade de qualquer entidade administrativa, devendo a Câmara Municipal do Seixal repor o material de propaganda política da JSD a que se refere o presente processo.»